Entrevista do mês de Setembro de 2014: Fernanda R. Mesquita

Quem é a Fernanda R. Mesquita?

Sou portuguesa residente no Canadá, na cidade de Edmonton, Alberta. Apesar de ter nascido e estudado no Liceu de Torres Vedras é da aldeia dos meus avós, onde fiz a escola primária, que guardo as principais recordações. A primeira parte do livro ´´Janelas`` foi inspirado nas recordações que mantenho da infância que vivi lá.
Sempre tive que lutar muito na vida e dediquei-me com o mesmo sentido profissional tanto em trabalhos importantes como nos ( como muita gente diria) de menor valor. Para mim todos tiveram o mesmo valor. Creio que a minha dedicação ao trabalho foi quase sempre reconhecida.
Sou extremamente simples e extremamente complicada. Simples porque gosto de viver o dia a dia sem artifícios e desligada ( a parte que me é possível) da névoa aparentemente macia e doce do consumismo mas que não passa de uma cela cheia de presentes que nos leva ao pico da fadiga ao querermos sempre mais e mais, porque na verdade esse mais transforma-se em insatisfação pois a ganância dos comandantes que tentam iludir-nos, não conhece barreiras.
Complicada porque tenho muita dificuldade em aceitar o modo em como aceitamos tão passivamente o que nos é imposto por politicas tão injustas. Desvio-me de guerras desnecessárias que possam causar um constante desgaste interior; respiro fundo, adoço o meu espírito e cravo a indiferença naquilo que poderia tornar-se um fardo pesado. Evito assim, esgotar as forças que preciso reunir para ´´embalar`` as pessoas que amo e enfrentar tudo o que realmente não consigo desviar e que tem que ser encarado de frente.
Acredito que o amor pode aquecer o pedaço de terra a que pertencemos e torná-lo diferente do mundo frio em que vivemos. Consigo desistir de alguém que eu ame se eu souber que isso tornará a pessoa mais feliz. Todas as pessoas são livres e se as aprisionamos é porque não as amamos.
Não acredito em meios termos, sobretudo nos afectos. As coisas são ou não são. Há quem me chame rebelde e inconformada. Não o sou no sentido pleno da palavra, mas em parte sim, sou. Procuro resolver qualquer problema até provar que não é possível encontrar uma solução, porque acho que para todas as coisas ( excepto uma doença incurável e a morte) podemos encontrar um resultado positivo. Não gosto de frases tipo: ( Pois, a vida é assim!).
Lamento que a escrita para muitas pessoas seja encarada como um facto insignificante. O ano passado tive que ficar em casa, por motivos de saúde e alguém me perguntou: ´´ Que fazes tu em casa o dia inteiro, agora sem trabalhar?`` Eu respondi: ´´ Escrevo``. Essa pessoa respondeu: ´´ Que chato, passar o dia sem fazer nada!``. Não respondi, apenas mudei de assunto.
Adoraria viver no meio da natureza. As grandes cidades consomem-me.

O que é para si a Poesia e qual a importância que a mesma tem na sua vida?

´´ A poesia é como uma flor milagrosa nos meus dias, a deusa magnifica que entra subtilmente nas horas em que me isolo. Abre os braços, dispondo-se a ser a testemunha secreta do meu romance com a vida! `

Em breve verá o seu livro publicado pela nossa editora. Quais as suas expectativas?

A maior expectativa já foi concretizada porque dois grandes passos já foram dados:
- Quando o escrevi e depois quando a editora poesiafaclube se disponibilizou a editá-lo. O resto será futuro. O que eu realmente gostaria (e penso que isso é comum em todos os escritores), é que fosse lido e entendido por um número razoável de pessoas. Sobretudo que futuros descendentes tivessem curiosidade em conhecer-me através daquilo que quero deixar escrito. Se um dia um neto ou um sobrinho, mesmo que seja apenas um, guardar com carinho o que eu escrevo e isso o ajudar a entender um pouco o mundo e quem sabe dedicar-se à escrita será muito, muito bom. O pior, e isso atemoriza-me um pouco, é se os meus netos ( se os chegar a ter) não falarem português. Infelizmente nem todos os pais e avós ensinam o português às crianças aqui no Canadá. Sinto imensa pena quando encontro descendentes portugueses sem falarem português. A língua portuguesa é linda, de uma profundidade extrema. Portugueses, não sintam vergonha da vossa língua materna, por onde quer que andem! ( Infelizmente isso acontece...)

Sabemos que tem um programa de poesia e pequenos contos/história na rádio Lusitânia no Canadá. É uma rádio com muita audiência nos emigrantes portugueses. Fale-nos um pouco deste projecto...

A Rádio LusitâniaCB pertencente a Carlos Carvalho, é uma rádio portuguesa, existente em Portugal para a qual eu fui convidada a fazer um programa. Eu faço o programa a partir daqui do Canadá. Todos somos de partes diferentes do globo; EU( Califórnia), Canadá, Brasil e Portugal.
A rádio tem uma audiência razoável.
O meu programa ´´Cordel de Palavras``, é um programa dedicado à leitura de poesia e prosa. Digo leitura porque não posso chamar declamação àquilo que faço no programa, mas tento fazer o meu melhor, dentro do que sei. Sou apenas curiosa. Com esse programa tento enaltecer os que escrevem em português. É um programa semanal, apenas com a duração de quinze a vinte minutos.
Sábados- 21.30, com repetição às Terça feira às 00.30

Deixe-nos uma sugestão para o Poesia fã clube...

Continuem essa luta, porque é uma luta, em levar ao mundo a palavra escrita de vários autores, sobretudo novos escritores. Continuem a fazer sentir que existe alguém do lado de lá, sempre disposto a comunicar com o autor interessado, por muito que o factor tempo não ajude. Nada pior do que uma editora indiferente às questões dos autores.

OBRAS MARCANTES:

A cabana do pai Tomás da escritora americana abolicionista, Harriet Beecher Stowe, que trata da escravidão como tema central. Foi um livro que me marcou porque o li apenas com 14 anos de idade e acentuou a já existente revolta em mim em relação à desigualdade entre as pessoas. Não aceito qualquer poder abusivo de um ser humano sobre outro ser humano.
´´Os esteiros`` de Soeiro Pereira Gomes.
´´Crescer vazio`` de Pedro Strecht. Fui aconselhada a ler este livro num tempo em que trabalhei com crianças em risco. No entanto tiveram grande importância as minhas primeiras leituras; as bandas desenhadas, Os cinco etc. É muito importante incentivar e deixar que a criança leia.

FONTE DE INSPIRAÇÃO:
Ah a fonte de inspiração! Tudo!

FILME PREFERIDO:
Kramer contra Kramer- O Filme conta a história de um divórcio, relatando seu impacto sobre a vida dos envolvidos, e a briga judicial pela guarda do filho do ex-casal, ainda criança. Os casais têm de aprender que quando se separam, não devem envolver os filhos nos seus problemas. Os problemas parecem ser o objectivo dos adultos e não o das crianças. No entanto os meus filmes preferidos são biografias e sobre História.

CANÇÃO PREFERIDA:

Não tenho nenhuma canção preferida. Existem várias, embora eu prefira perder-me nos sons dos instrumentos. Gosto sobretudo de violino, piano e flauta. Gosto de jazz e blues e música clássica. Adormeço muitas vezes ao som de NOCTURNES de FREDERIC CHOPIN, Liszt, Claude Debussy etc. Além de calmantes são inspiradores.

JANTAR PERFEITO

O que preparo diariamente para a minha família. Sou um pouco chata; gosto de os ver à mesa, satisfeitos a saborearem o que cozinhei para eles e não resisto em passar um jantar sem que pergunte um a um se está bom. Eles chamam-me chata mas eu gosto.
O relacionamento humano é uma obra que se recusa a ser exposta como pronta porque exige um talento contínuo.

Muito obrigado poesiafaclube

Fernanda R. Mesquita

Comentários

As entrevistas, por vezes destapa um pouco do véu da personagem, trazendo à colação algumas das suas caracteristias.

Não quero entrar pela vulgaridade, dos adjetivos. Gostei muito da mesma e relevo a sa ultima frase "O relacionamento humano é uma obra que se recusa a ser exposta como pronta porque exige um talento continuo", decanta o erudito num processo de evolução.

 

 

Obrigado João Murty! Uma boa semana para todos, sobretudo para a Maria João.

Fernanda

Muito inteligente a entrevista e a  entrevistada!

Parabéns!

Muito obrigado Madalena.

Você é um presente  de Deus! Estamos juntos em família neste sítio poético!

Parabéns; mais uma vez!