Jazz da Meia Noite

Toca o jazz da meia noite.
Jiggy jiggy, jizzy jazz...
Cigarro a evaporar na ponta dos dedos.
Blues da morte,
Música de má sorte...
Batidas lentas, dinâmica forte.
Súbito saxofone que me rasga em dois,
Que me congela a alma
Da mais profunda calma.
Improvisos solados, ascendentes,
Entre outros tão decadentes...
Montanha russa de melodias
A aquecer-me as noites frias.
Bateria a marcar compasso
Com o escárnio odioso
Com que pelo mundo passo.
E o contrabaixo, lá do seu alto,
Vai fazendo a cama grave
Em que a música se repousa.

Miro por entre a janela
Candelabros escuros de cidadela,
Tristes lampiões solitários
Que dão sua luz em troca de nada,
Iluminando o ninguém ausente
Que pelas ruas passa.
Emanam o amarelo doente das luzes escuras,
Que se estende humilde até poder,
Ziguezagueando por entre as frinchas de noite cerrada
Indo esmorecer em fachadas de casas.
Precário como tudo.
No prédio da frente,
Há esboços de janelas empilhadas.
Delas todas, somente sete iluminadas.
E essas sete, lentamente,
Como em contagem decrescente,
Uma a uma se apagam,
Desistem de permanecer,
Rendem-se ao irrevogável breu sisudo
Que nos há-de recolher.
Devo ser a única vela acesa que resta
Nesta cidade adormecida,
Por entre esta terra morta
Que se retesa e entorta
No sono do tempo.

Tenho mosquitos a beijar-me o vidro,
Companheiros únicos de minhas noites longas
A sugar a fome do rarefeito ar nocturno.
Também eu me rendo.
Também eu me estico na cama.
Cubro a cabeça com a mais espessa manta
A asfixiar no sono.
Adormeço.
Amanhã há mais.
...Ou talvez não.
Mas o jazz fica a tocar
Para meus sonhos infrutíferos.
Esse não esmorece, não.
Jazzy jiggy, jizzy jagg
Jiggy jiggy, jizzy jazz...

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Comentários

Belo poema! Gostei!

Abraços!