Dedicado

Esboceto (A PEREIRA BARATA)

Como uma semi-tinta de aguarella,
Côa-se a luz, dulcissima, velada
Atravez das persianas da janella,
Sobre a pequena sala alcatifada.

N'um cavallete, apenas debuxada,
A tons ceruleos, sobre larga tela,
Uma marina calma, socegada,
Com botes de pescar, vogando á vela.

Sobre a meza rodeada de cadeiras,
Destaca, entre revistas estrangeiras,
Um busto de mulher adolescente

E a brancura leitosa do teclado
Põe no piano, entreaberto, ao lado,
Um ar de monstro, arreganhando o dente.

Perdularia

(A PIO CAVALHEIRO)

Passou junto de nós, pedindo esmola,
Uma creança rota, magra, invalida.
Deitaste-lhe dinheiro na sacola,
Beijaste-lhe em seguida a face pallida.

Que feliz foi o pobre da sacola!
O seu desejo era bem mais modesto.
Podias dar-lhe unicamente a esmola
E a mim--dares-me o resto...

A HERMANN

A HERMANN

Por occasião d'um beneficio a um asylo

    «Conchega a mãi ao peito o filho caro;
    Estende a pomba as azas no seu ninho
          Pelos filhinhos seus.
    Embala o arbusto agreste; o fructo amaro.
    Guia a bussola o nauta em seu caminho,
          Como um dedo de Deus.

A Alberto de Oliveira

(IMPRESSÃO DA BIBLIA DO SONHO)

Emquanto os outros vão, ao som das guitarradas,
Capas a desfiar, batinas sem botões,
Entre explosões joviaes de intensas gargalhadas,
Cantando alegremente eroticas canções,

Elle despresa a vida, o riso, os corações
E n'um mystico horror d'almas fanatisadas,
Foge do mundo e vae, á busca de illusões,
Em frageis bergantins de velas enfunadas.

Talento peregrino o seu ideal recorda
Um extasis de monja em frente d'um altar,
Á hora em que o sol morre e a lua meiga acorda.

*D. QUICHOTE*

A Luciano Cordeiro

     O que é isto?

Nos tempos medivaes dos campeões andantes,
E das balladas como a do bom rei de Thule,
Andava D. Quichote em busca de gigantes,
Magro, tristonho, ideal, crente Fausto do Sul.

Batalhador juiz da Virtude e do Crime,
Defendendo o opprimido, a mulher, o ancião,
Corria o mundo assim, ridiculo e sublime,
Em seu magro corcel, sob arnez de cartão.

A D. CANDIDA NAZARETH

A D. CANDIDA NAZARETH

Por occasião da morte de sua irmã Rachel e, poucos dias depois, de sua mãi

    Despe o luto da tua soledade
    E vem junto de mim, lirio esquecido
            Do orvalho do céo!
    Tens nos meus olhos pranto de piedade,
    E se és, mulher! irmã dos que hão soffrido,
            Mulher! sou irmão teu.

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