NUM ALBUM (Improviso)

 

(Improviso)

      Se eu fôsse um vate inspirado,
      Cantor das rosas singelas,
      Ah! quantas coisas tão bellas
      Tinha aqui para dizer!
      Mas eu tenho horror á brisa,
      Odio ao prado, odio ás estrellas,
      E então aos vates das _ellas_
      Nem sequer os posso ver.

      Tu tambem, posto que a vida
      Para ti sorria agora
      Como sorri uma aurora
      Dos puros dias de abril,
      Não morres pela açucena,
      Nem deliras contemplando
      A lua que vai passando
      _Pelos vastos ceos d'anil_.

      E inda bem que a Providencia
      Te livrou de tal abysmo;
      Ó terrivel romantismo,
      Quando has de um dia acabar?
      Eu conheço uma menina,
      Bella, gentil, seductora,
      Mas, meu Deus, é tão doutora
      Que se não pode aturar!

      Arranja umas taes carinhas,
      Toma umas taes posições,
      Falla em sonhos e illusões
      No seu romantico ardor!...
      Pois é pena, que é bonita,
      Talvez seja até formosa;
      Se não fosse _preciosa_
      Era um ente encantador.

      Se lhe dizem que é feliz,
      Solta um suspiro profundo,
      Porque ninguem neste mundo
      Até hoje a comprehendeu!
      Salvo um ente idolatrado
      Porém esse... oh! desventura!
      Para a fria sepultura
      Na flor da vida desceu!

      Emfim, se alguem lhe protesta
      Que inda ha de viver tranquilla,
      Ergue em extasi a pupilla
      Pondo a mão no coração!
      Imagina o desgraçado
      Que tenha a louca mania
      De ir batter comsigo um dia
      Neste abysmo de paixão!

      Oh! Bem hajas tu que és bella,
      Gentil, graciosa, elegante;
      A alegria em teu semblante
      Co'a innocencia anda a saltar:
      Bem hajas tu que detestas
      Todos os vates das _ellas_,
      E as romanticas donzellas,
      Que andam sempre a declamar!

Janeiro de 1862.
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